terça-feira, 19 de abril de 2011

Fome

Sinto fome. Tenho me alimentado muito mal nesses últimos tempos.
Admiro-me, pois tenho sido forte.
Nutro-me, apenas, das lembranças de outrora.
Não. Não é um alimento saudável, estou certo disso, mas é o que mantém a ordem dentro de mim, é o que me causa um pouco de paz.
Caso não estejas entendendo, meu caro leitor, falo da fome da alma, do coração, e não daquela que nos toma o estômago.
Pois bem, meu coração já está fraco e minha alma dispersa, apesar de ainda possuir muitas lembranças, apesar de estarem ainda quentinhas, saídas do forno.
Tem dias que, assim como um estômago faminto, minha alma revira-se de fome, e as lembranças, as lembranças não bastam para alimentá-la.
Tem dias que meu coração se contorce e estremece.
Agora, nesse mesmo instante, ao vomitar essas palavras, sinto uma agonia tamanha. Antes de aqui vir, devorei as cartas e fotografias ainda guardadas em minha carteira, devorei o barulho do vento na janela daquela sala, devorei meu corpo e o dela abraçados no chão do quarto, devorei o sorriso, os olhos, os cabelos, devorei a imagem dela dormindo e a manhã surgindo... devorei o “Ei, eu te amo”, devorei as risadas, o estalar do dedo, mas não basta, não basta, NÃO BASTA.
Continuo sentindo fome da presença.
Minha alma sente fome, minhas mãos sentem fome, minhas pernas, minha face, minha boca, meu coração.
Só sei que sinto fome, e tem dias que lembranças, apenas, não bastam...